domingo, agosto 21, 2011

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A vez dos artigos - SABINE RIGHETTI

Publicar em revistas científicas pesa tanto que já substitui as teses em cursos de pós-graduação
SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO

Os periódicos científicos, onde pesquisadores publicam seus estudos, têm ganhado em importância. A tal ponto que, no Brasil, seguindo países como Holanda e EUA, alguns programas de pós-graduação já substituem a obrigação de escrever uma tese por artigos científicos.
O aluno pode defender, em banca, três trabalhos publicados ou aceitos para publicação em revistas científicas. Pelo menos dois deles devem estar em periódicos de "alto impacto", ou seja, aqueles que são muito citados por pesquisadores.
A substituição da tese pelos artigos é feita com aval da Capes (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), que avalia a pós-graduação no país.
No Instituto de Biociências da USP, por exemplo, os alunos podem escolher entre a tese "padrão" ou os artigos.
"Ninguém lê tese, a não ser os membros da banca. Se o trabalho não for publicado, vai ficar jogado numa biblioteca", diz a geneticista Mayana Zatz, uma das entusiastas do formato. "Juntar papers já publicados é o melhor que pode ser feito. Na Holanda, eles já fazem isto há muito tempo", afirma.
"A publicação prévia é importante, mas não podemos deixar nas mãos das revistas a titulação dos alunos. A defesa da tese tem de ser mantida", alerta Rogério Meneghini, coordenador científico do Projeto SciELO, que reúne publicações da América Latina com acesso livre.
Além de disseminar as informações acadêmicas mais facilmente, os artigos dão mais visibilidade à produção científica do país. Hoje, o Brasil está em 13º lugar no mundo em quantidade de artigos publicados.

MAIS RANKINGS
Mas os artigos não podem ser publicados em quaisquer revistas. Gestores têm criado rankings de periódicos para classificá-las.
No Brasil, o Qualis, da Capes, cumpre esse papel e classifica, por área de conhecimento, cerca de 17 mil títulos. Quem publicar mais nos melhores periódicos, ganha nota mais alta. E quem tiver as notas mais altas, recebe mais recursos, como bolsas.
A ligação direta entre a publicação de artigos e distribuição do dinheiro público para ciência tem tirado o sono dos pesquisadores, principalmente daqueles cujas revistas correspondentes à sua área não estão no topo.
"No meu campo de estudo, administração de empresas, o ranking não reflete a realidade", diz Ross Thomas, editor do "Journal of Educational Administration" e professor da Universidade de Wollongong, na Austrália.
Naquele país, o governo distribui R$ 2,8 bilhões para pesquisas de acordo com a "qualidade" da revista em que os trabalhos são publicados. Como não ocupa os primeiros lugares no ranking, que reúne 22 mil revistas do país, a área de Thomas fica com uma fatia pequena.
É isso também que acontece com as ciências humanas, cuja produção aparece mais em livros do que nas revistas. "É preciso adequar a metodologia [de avaliação] para essa área", diz Isidro Aguillo, do Laboratório Cybermetrics, do CSIC (Conselho Nacional de Pesquisa da Espanha).
A distribuição de recursos de acordo com as áreas que mais publicam causa o que a sociologia da ciência chama "efeito Mateus". O nome é uma alusão à passagem bíblica que diz "a quem tudo tem, tudo lhe será dado".
"Quem mais publica artigos continua recebendo mais recursos", diz Maria Conceição da Costa, socióloga da ciência da Unicamp.





Em 1991, ao reestruturar um programa de PG, já incluí a possibilidade de tese no formato de artigo(s). Ao longo desse tempo fui percebendo que as teses incluem muitos erros, parte dos quais são eliminados na publiação em revistas científicas de boa qualidade. Além disso, a forma predominante é a publicação de artigos; no sistema convencional, o aluno é preparado para isso aprendendo os equívocos na confecção de teses (que geralmente o afastam das boas revistas).

Sem dúvida, é um grande avanço a Capes aceitar esse formato de tese como artigos, o que já deveria ter ocorrido há uns 20 anos. Porém, temos que tomar um cuidado... a cabeça do aluno não pode ficar fatiada como na produção de papers. Acho bom que ele perceba que um conjunto de papers pode ser agrupado para se defender uma Tese mais ampla. Se isso estiver presente, acho ótimo. Acho estranho que se forme um Doutor (PhD) simplesmente porque publicou 1 ou 3 artigos; o ideal é cobrar dele os requisitos intelectuais para construir grandes ideias. Se o artigo está inserido nisso, então acho ótimo.

Quanto aos rankings das revistas, ou da atividade científica, notem que gradativamente estamos caminhando para análises de "eficiência". A Capes faz isso ao dividir as produções pelo número de orientadores e o ISI mostra isso ao calcular o número de citações dividido pelo número de artigos. Essa é uma medida interessante, uma vez que a produção científica tem um custo (econômico ou social) e isso deve ser ponderado. Quem publica demais, mas é pouco eficiente, é gastão! Quando os principais índices considerados estiverem olhando para este lado, então estaremos caminhando melhor. O que vale não é o número de produções, mas a qualidade delas.

Esta última observação é também válida para a confecção de teses. Não é o número de páginas que determina qualidade. Há áreas que se a Tese não parar em pé sozinha, não está boa. Temos que incluir na nossa ciência a noção de qualidade independente da quantidade. A quantidade só é importante quando acompanhada de qualidade. Assim, a tese na forma de artigos poderá ficar curta, mas acredito que tem muita chance de ter maior qualidade.

E com isso a Capes pára com essa besteira de publicar tese na Internet. Isso é prejuízo social. Os equívocos que bancas complacentes deixam passar vão direto para a Internet, com o aval da tese e da Instituição, incutindo equívocos em pessoas da ciência e, o que é pior, fora dela. Vejam se um medicamento seguisse tal percurso!


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