quarta-feira, agosto 03, 2011

Quatro "mundos" diferentes dentro da mesma sala de aula Variação exige que docentes adaptem a aula aos variados tipos de alunos


Quatro "mundos" diferentes dentro da mesma sala de aula
Variação exige que docentes adaptem a aula aos variados tipos de alunos

ANDRÉA JUSTE





Cada aluno tem seu mundo particular dentro da sala de aula. Existe o jovem da primeira carteira, o que fica "na dele", o inseguro e aquele "do fundão", que pouco quer saber da aula. Tomando como base um teste psicológico, pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) fizeram uma comparação entre os resultados e o modo como seria o comportamento dessas pessoas no ambiente escolar.

A conclusão é que existem quatro perfis de estudantes: estáveis, externalizados, internalizados - ou inibidos - e instáveis. "No site, vemos a escolaridade, repetências, salário. Essas variáveis e os níveis escolares estão associados a diferenças de temperamento", explica o médico psiquiatra Diogo Lara, coordenador do estudo e professor titular da Faculdade de Biociências da PUC-RS.

Segundo ele, a escolaridade é maior quando o temperamento é estável. A aluna do 3º ano do ensino médio Natália Peixoto de Azevedo, 17, é um exemplo do perfil. "Sou a aluna da primeira carteira e anoto até quando o professor respira", brinca a adolescente, que irá prestar vestibular para medicina. Além disso, Natália se considera atenta e responsável, características do comportamento estável.

Quem faz parte do fundo da sala integra o grupo dos externalizados. "Gostam de atividades mais participativas, mas têm dificuldades de engajamento em aulas lentas", diz Diogo Lara, ressaltando que costumam ser do tipo que não se organizam, mas são muito inteligentes. "São desses que estudam o mínimo. Dizem nos EUA que o aluno A é o presidente da empresa, o B é o gerente e o C é dono", comenta sobre a característica de quem gosta de correr mais riscos.

O jovem Guilherme Augusto Ávila Silva, 18, estudante do 3º ano, é a demonstração do comportamento. "Estou entrando na vida profissional para me arriscar. Estou de peito aberto. Se ficar conservador não vou crescer", diz ele, que irá prestar vestibular para engenharia civil. Guilherme também é do tipo que surpreende com o rendimento. "Tem professor que até fica com raiva porque eu converso muito e vou bem na disciplina", brinca ele, que prefere estudar nas vésperas das provas.

Os resultados da pesquisa serviram de alerta quanto ao rendimento dos estudantes. Pessoas internalizadas, com pouca motivação e apáticas são prejudicadas na evolução dos estudos. "Ele não fica tão na frente para não chamar a atenção do professor, mas não quer ir para trás, no pessoal da pesada. Então fica no canto, tenta se esquivar, nunca vai ser o que quer participar espontaneamente", diz Lara. Os instáveis, por sua vez, possuem altos e baixos. "Eles têm menos interesse genuíno na aula", comenta.

Para que todos esses mundos façam parte do aprendizado, a indicação do pesquisador é a adaptação mútua entre universos de professores e alunos. "O temor do docente é perder controle. Não adianta dar uma aula que apenas 50% da classe aproveita. A variação é importante para refrescar o cérebro, a concentração", orienta.

Uma dica para os docentes universitários se refere aos primeiros anos de faculdade. "Nos dois primeiros anos, eles recém-saíram da escola, então a aula tem a combinação da prática interativa com a teoria", diz Lara, alertando ainda que o tipo de motivação que o aluno tem para estudar conta muito para a participação em sala.
ANÁLISE
Professores devem buscar entender o universo dos alunos
Para que uma aula seja bem-aproveitada pela maioria dos estudantes, uma das recomendações é que os professores tentem entender a realidade dos alunos. "Eles são adolescentes, então têm pontos em comum. O professor tem que saber o que eles fazem no dia a dia, os programas de TV que assistem, músicas que escutam, senão fica longe da realidade deles", afirma o professor de história Flávio Freitas, da Escola Estadual Gama Cerqueira, em Belo Vale, na Grande Belo Horizonte.

Freitas acredita ainda que a estrutura da sala de aula é antiga. "Achar que o aluno vai se interessar por tudo é utopia. A escola do jeito do meu bisavô é a mesma de hoje", opina.

Preservar o interesse do estudante é o grande desafio de todos que ensinam, comenta o professor de sociologia do Colégio Arnaldo, João Baracho. Uma das alternativas, segundo ele, é criar debates em sala, dando fôlego às aulas expositivas. "Tento criar um ambiente de confiança dos alunos comigo. Não é ser amigo, mas fazer com que eles percebam que estou ali para auxiliá-los e não em um pedestal", comenta.

Segundo Baracho, os alunos mais internalizados são os mais difíceis nessa relação. "Aquele que faz muita bagunça é identificado rapidamente. Na mesma aula, posso tentar um artifício para incorporá-lo à discussão. O internalizado é difícil, pois não sei se ele está envolvido ou no ‘mundo da lua’", explica.

Porém, não existem receitas para lidar com cada turma, lembra o professor de física e matemática Bernardo Caetano, do Instituto Libertas Educação e Cultura e da Pólen Escola Waldorf. "Às vezes funciona conversar, conhecer a família", diz. Em casos de estudantes com problemas de disciplina, a ideia é uma ação em conjunto entre os docentes. "Se o aluno percebe em cada aula que as ações dele têm consequências, ele consegue responder bem", acredita, ressaltando que a escola precisa oferecer suporte aos professores e deixar regras e limites claros aos estudantes. (AJ)

Um comentário:

Silenciosamente ouvindo... disse...

Li atentamente este seu post.
É para reflectir.
Um abraço