quinta-feira, agosto 18, 2016

5 lições que “A Revolução dos Bichos” nos ensinou

A fábula distópica de George Orwell, autor de 1984, é uma aula sobre o início do século 20

POR BRUNO VAIANO*

 (Foto: YouTube/Divulgação)
Em 17 de agosto de 1945 a obra a A Revolução dos Bichos ("Animal Farm") era publicada na Inglaterra. Na fábula distópica de George Orwell, autor do também clássico 1984, um grupo de animais revolucionários toma o poder dos donos humanos de uma fazenda e organiza um regime igualitário e justo no local. O equilíbrio é ameaçado, porém, por uma dupla de porcos totalitários. Não darei mais spoilers, leiam!
O livro é uma sátira ácida das práticas do ditador Joseph Stálin e da própria história da União Soviética, feito por um socialista democrático crítico ao que o regime instituído pela Revolução Russa se tornara. E está, claro, repleto de lições sobre o que foi o mundo no meio século 20. Essas são algumas delas. 
1. Que a tradução de um título pode ser um spoiler
Em inglês, o título da fábula ácida de Orwell é mais simples: "Animal Farm", que em tradução literal é algo como “fazenda dos animais”. Ou seja, não diz nada sobre o fato de que os animais da fazenda em questão organizariam uma revolução.
Em Portugal, os tradutores também não foram menos cruéis que aquele amigo dos comentários de uma matéria sobre Stranger Things. Houve a versão “A Quinta dos Animais”, idêntica ao inglês – “quinta” é fazenda em português de Portugal –, mas também houve o comprometedor “O Triunfo dos Porcos”.
É difícil discordar do apelo das versões lusófonas. Afinal, entre as incontáveis opções de uma livraria, você escolheria uma menção discreta ao fato de que há animais em uma fazenda ou uma promessa de guerra civil no chiqueiro? Pois é. O título pouco revelador da edição original, porém, não impediu que ele se tornasse um hit literário do pós-guerra, cujas vendas continuam aumentando até hoje (Trump, alguém?).
2. Que alianças diplomáticas e militares não se baseiam em ideais, mas em interesses
Orwell foi combatente na Guerra Civil Espanhola, espécie de “ensaio” para a Segunda Guerra Mundial que foi coberto também pelo então repórter Ernest Hemingway. Lá, conheceu de perto o horror propagado pelo exército soviético de Stálin – e percebeu que o sanguinário regime totalitário não tinha nada a ver com o socialismo democrático em que acreditava.
Para piorar a situação, a aliança formada entre Inglaterra e União Soviética para combater a Hitler – é difícil de acreditar que logo após o final da guerra a suposta “amizade” diplomática se tornaria a Guerra Fria – gerou uma cartilha de práticas midiáticas que tinham o intuito reabilitar a imagem da URSS no imaginário britânico. A ideia era fazer a população acreditar que o “terror vermelho” – que entre execuções em massa, trabalhos forçados e fome foi responsável pela morte de algo entre três milhões e 60 milhões de soviéticos – era uma invenção da propaganda nazista, justificando a aliança.
Orwell, que na época trabalhava no grupo de mídia BBC, pediu demissão, e escreveu o livro motivado a revelar, de maneira velada e alegórica, o real caráter do regime stalinista.

3. Que rock n’ roll e literatura são uma ótima combinação
Não foram só leitores comuns que aprenderam muito com A Revolução dos Bichos. No topo da lista de ídolos que fizeram música inspirada na obra de Orwell está o Pink Floyd com o álbum Animals. Em 1987 o R.E.M. escreveu a canção "Disturbance at the Heron House" com o escritor britânico em mente, às vésperas do anúncio de que o conservador George H. W. Bush– pai do Bush que era presidente na época dos ataques de 11 de setembro – iria concorrer à presidência.
O grupo punk The Clash usou uma imagem de uma animação inspirada no livro de Orwell como capa do single "English Civil War", lançado em 1979, e em uma menção mais discreta, o Radiohead cita a obra em um dos versos da canção "Optimistic".
 (Foto: Divulgação)
4. Que na guerra a liberdade de expressão é muito relativa
Não houve censura estatal instituída formalmente na Inglaterra durante a Segunda Guerra. Mas o medo de discordar da posição governamental gerou um notável processo de autocensura, completamente voluntário. Poucas editoras, durante o conflito, teriam coragem de manchar a própria imagem junto ao Ministério da Informação publicando obras que ameaçassem, mesmo que de forma velada, a visão positiva da opinião pública sobre a aliança entre Estados Unidos, URSS e Inglaterra.
Orwell afirmaria posteriormente, em um artigo escrito na revista Partisan Review, que “agora é impossível imprimir qualquer coisa que se oponha demais à Rússia. Livros contrários à Rússia aparecem por aí, mas a maioria é de editoras católicas e tem um ponto de vista religioso e reacionário.”
5. Que força física sem consciência política não significa nada
Orwell teve a ideia para sua fábula distópica após se dar conta de que o ser humano é capaz de domar e comandar animais pelo fato de que eles, apesar de mais fortes, não têm consciência de que estão sendo dominados, e que uma relação parecida se estabelecia entre patrões e o proletariado.
Ou seja, se serviu do próprio princípio da fábula, a inversão entre o papel humano e o animal, como paralelo para a organização do trabalho na sociedade capitalista, para então demonstrar que as relações de poder que se formariam entre os próprios proletários após a revolução poderiam deturpar o ideal socialista. Uma aula de história. 
*Sob supervisão de Nathan Fernandes.
veja aqui dublado https://www.youtube.com/watch?v=2ygQBkmMfqY

via Galileu

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