Sabe aquela sensação angustiante de correr contra o tempo por objetivos que, na verdade, não buscamos, enquanto atropelamos nossas verdadeiras vontades e convicções? Se você nasceu entre os anos 1970 e 2000, provavelmente já provou desse sentimento amargo, fruto de uma rotina cada vez mais fugaz e impessoal, que age como uma verdadeira máquina de frustrações.
Assim como eu e você, muitos partilham desse embate existencial – principalmente no universo da arte. Não faltam exemplos de artistas que, ao obter o tão perseguido sucesso, depararam-se com a tristeza e o desespero. É o caso do rockstar retratado em “Heróis: Uma Pausa para David”, da Suacompanhia, espetáculo em cartaz no Sesc Palladium que integra a recheada programação de aniversário da casa.
Com texto e direção de Paulo Azevedo, e interpretação de Samira Ávila, a peça usa a história do astro de rock David para refletir sobre as angústias e incertezas dos tempos atuais. “David é uma mistura de referências que foram surgindo a partir de 2013, quando surgiu meu primeiro argumento, que foi o suicídio de Ziggy Stardurst por David Bowie”, conta o diretor, lembrando a história do personagem criado pelo músico britânico em 1971.
“A ideia nunca foi fazer um espetáculo biográfico, mas contar a história de alguém que persegue um sonho e, quando o encontra, quer largar tudo. E isso se aplica aos dias de hoje. Estamos todos correndo, correndo e deixando de viver o que queremos”, completa.
Rock
Azevedo conta que, durante as pesquisas, notou esse niilismo existencial muito presente nas gerações subsequentes aos floridos e utópicos anos 60. “As referências são principalmente o rock britânico e norte-americano dos 60 e 70, como o próprio Bowie, The Who, Rolling Stones, Bob Dylan”, conta, lembrando que músicas desses e outros artistas compõem a trilha do espetáculo. “Entendemos melhor os mitos dos 27 anos, a busca intensa que eles tinham por viver seu tempo. Eram de uma geração que viveu ideologias apaixonantes nos anos 60 e encontrou o niilismo nos 70, quando viram que aqueles antigos valores já não lhe serviam mais”, defende.
Paulo Azevedo afirma que a plateia tem um papel fundamental na peça. “Não defino como monólogo, mas como um espetáculo compartilhado”, diz. “A história se desdobra quando David depara-se com uma formiga no caminho para uma gravação. Ali, ele tem um lapso, uma crise, e começa a se perguntar porque aquele animal tão pequeno tem domínio de si mesmo e ele, um rockstar, não”, revela. “Na sequência, o personagem interage com o público, respondendo perguntas profundas, como: ‘Porque eu faço o que faço? Porque decidir fazer isso? Como eu crio? Porque sou um herói?”.
O diretor pontua que o espetáculo não é sobre David, mas sobre as questões com as quais ele lida – e nós, de certa forma, também. “O fato de ele ser um rockstar se dilui, porque quem o define assim são os outros. E não temos domínio sobre o outro. Nem sobre o tempo, nem sobre as circunstâncias da vida”
“Heróis: Uma Pausa para David”
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