quarta-feira, maio 04, 2011

Democracia direta ou representativa?


Como deve ser a interlocução entre poder público e sociedade civil articulada no campo da cultura? Nos últimos anos, vimos uma superposição de instâncias de participação, entrecruzadas por conselhos, câmaras, colegiados, comitês, grupos de trabalho, sindicatos, partidos políticos e um sem-número de iniciativas como consultas públicas, conferências, encontros e seminários.
Se por um lado o diálogo direto com o povo supre um vácuo centenário de presença do Estado, por outro gera uma quebra sistêmica, colocando a já desgastada democracia representativa em xeque, confrontando-a com uma frágil e caótica teia de relações que empodera agentes escolhidos por força da proximidade e empatia, reforçando vínculos clientelistas com feudos e igrejinhas legitimados pela força do poder público.
A coexistência entre democracia direta e representativa nas políticas culturais é uma urgência. Mas é preciso ciência. Governo e sociedade precisam se articular para criar novas metodologias de diálogo, que sejam legítimas, democráticas e fortaleçam as instâncias de participação, organizadas para facilitar o fluxo de informação, a transparência e a inclusão de agendas urgentes para a construção de uma democracia cultural.


Leonardo Brant http://www.brant.com.br
Pesquisador independente de políticas culturais, autor do livro "O Poder da Cultura". Diretor do documentário "Ctrl-V | VideoControl, criou e edita o site Cultura e Mercado. É sócio-diretor da Brant Associados, consultoria para desenvolvimento de negócios culturais. Para mais artigos deste autor clique aqui


O modelo de representação está em franco desgaste, especialmente com o incremento do ativismo cidadão pela web, criando uma forma corrente e legítima de pressão aos tais representantes eleitos ‘democraticamente’.
A ampliação da participação social direta – mesmo que ainda um tanto “entrecruzada”, como citado, por diversas estruturas organizativas – deverá ser o caminho para que as políticas públicas possam ser tão eficientes como as propostas de marketing ‘one-to-one’, preconizadas desde os anos 90!
Essa reforma política que o senado pensa hoje, com raras exceções como o financiamento público, parece perpetuar o foco nos interesses de sempre e não leva em conta o acúmulo do exercício democrático e a transformação inevitável pela cultura digital ocorridas na última década no país.

Zonda, é por aí mesmo que eu gostaria de continuar a discussão. As novas tecnologias de informação e comunicação abrem caminho para uma nova forma de participação, uma cidadania digital que se consolida a cada dia. Mas ela ainda é restrita a uma parcela pequena da população. A vontade dos que utilizam facebook e twitter não pode representar a vontade do povo brasileiro. Nesse sentido, há uma repetição da concentração de poder nas mãos das elites, agora também digitais.
Com certeza o futuro da democracia depende do acesso a essas tecnologias, mas isso é só o começo. Sem investimento em cultura e educação, apenas reforçaremos os vícios de concentração de poder e mediação de informação já existentes em nossa sociedade.
Robson Santana:
Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Acho que nunca conseguiremos fazer com que as instâncias de participação realmente funcionem no Brasil. Sempre tem os lobbies, os acessos privilegiados. A diferença é que antes só a elite tinha esses acessos, agora os representantes do povo também tem. É claro que esses representantes se tornam uma nova elite, como na África do Sul, por exemplo. Concordo com o Brant que este é um dos maiores desafios no novo Ministério da cultura.

Renato:
Caro Leonardo,
Ótimo ponto que você atingiu. É exatamente algo que estou querendo dialogar, aproveitando que estou para começar a trabalhar com a Cultura Digital no MinC: as mudanças que a cultura digital insere para a cultura política dentro do modelo democrático – o verdadeiro conceito de participação.
Isso incluiria um histórico dos instrumentos utilizados nos últimos anos, como vc citou: conferências, consulta pública, seminários, encontros entre outros. Até aonde podemos chegar com esses instrumentos? O desenvolvimento das tecnologias aumenta muito o canal de comunicação e de participação. Acredito que é uma discussão a ser estendida para os demais campos, não se submentendo apenas às políticas culturais.
Ainda é uma ideia embrionária. Essa discussão pode ajudar. Vou ficar de olho no que surgir por aqui.
Um abraço.

Brant, os Colegiados nesse sentido desempenharam um “bom papel”, nesse sentido de interlocução – poder público e sociedade – (eu fiz parte da primeira gestao do colegiado de artes visuais 2005-2009 e de fato vários fatores vimos refletidos em nossas discussões de planos e ações), mas oque vi no final do mandato passado foi um atropelamento e a perda no diálogo com a classe e o resultado foi o próprio edital PROCULTURA lançado ano passado (e em atraso nesse momento), que foi o pior texto e planejamento de edital do MINC……. como que sem noção nenhuma do que tinha sido já realizado em todas as áreas…….
nesse sentido, é bem lembrar que o diálogo é feito por duas partes e se a “parte que gere” “não quer”, toda a classe mobilizada pode solicitar audiência por meses a fio, indicar e re-indicar moções em reuniões de CNPC e mil etcs…… mas tem que haver transparência e diálogos diretos…… e interesse em de fato colocar essa consulta pública como instância de equilibrio de planos..

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